quarta-feira, 30 de junho de 2010

Casca de banana

'Tô' sempre repetindo que minha alma é vadia, mas o meu corpo não pára, e trabalha tanto, que até cansa. Pra meu descanso, procuro fazer o que a gente chama “pensar em nada” – devagarinho, cal-ma-men-te...
Dia desses, fiz isso, e o que me veio à cabeça foi uma casca de banana. Você já parou pra pensar numa casca de banana?... Eu parei. E gostei de pensar na casca de banana. Até fui atrás de uma casca de banana (fruto que como, quase sempre), e fiquei admirando a casca, imóvel diante de mim. Confesso que, naquele instante, não pensei mais do que estava enxergando: uma casca de banana.
Se fosse nutricionista, provavelmente, eu teria pensado que a casca de banana contém potássio, vitaminas A e C, fibras, etc e tal. Não sou nutricionista – não pensei nisso.
Se fosse skatista, eu pensaria no perigo de uma casca de banana jogada na pista, principalmente, durante manobras, como “flip”, “grinds”, “board slide”, ou outras mais radicais. Não sou skatista – não pensei nisso.
Se fosse escritora renomada (que “tudo pode”), eu criaria uma personagem representada pela casca de banana, provavelmente a chamaria Chiquita Banana, que viveria em Banana City. Não sou escritora – não pensei nisso.
Mas eu poderia ser ainda doceira, e preparar doce de casca de banana, ou bife de casca de banana (nunca comi). Não sou doceira – não pensei nisso.
Ah, se eu fosse curandeira, pensaria que casca de banana retira verrugas. Não sou curandeira – não pensei nisso.
A casca de banana – tão-somente ela, diante de mim. Se eu pensasse mais, não iria além: uma casca de banana. Como é bom pensar numa casca de banana – relaxa, por que não vai além, nem aquém. Uma casca de banana. Só.

domingo, 27 de junho de 2010

História que não se conta

Durante o dia, era apenas mais uma planta, sem grandes atrativos, e por isso deixada de lado pelos olhares apressados. As flores eram poucas, e murchavam rapidamente, sem sequer serem notadas. À noite, ela reinava, absoluta, perfumando até os recônditos inimagináveis da alma humana. Mas ninguém tinha tempo e disponibilidade para pensar sobre isso. O tempo passava pela planta, desfolhando-a em desamparo.
Num dia qualquer, um ser humano distraído observou a planta, no canteiro da praça, e resolveu levá-la para casa. Na primeira noite, a planta encheu-se de perfume – tanto, tanto, que embriagou não só o ser humano, mas a humanidade inteira.
O ser humano, tão logo despertou para o que conhecia como ciência, tratou de descobrir que planta mágica era aquela. Escarafunchando velhos livros, com páginas esquecidas até pelo tempo, nos porões da biblioteca pública, descobriu tratar-se da “dama-da-noite”, de nome científico “Cestrum nocturnum”. Ávido por mais informações, leu em tantos livros que “a pungente fragrância da dama-da-noite é uma dos mais fortes entre as plantas, e suas flores atraem diversas espécies de abelhas, beija-flores e borboletas”.
Os olhos do ser humano encheram-se de orgulho, vaidade e ambição. Nos dias que se seguiram, o ser humano tratou de trabalhar em um projeto de divulgação da planta perfumada. Depois, o ser humano manteve contato com outros seres humanos (mais importantes), e passou a realizar viagens, pela humanidade inteira, exibindo a então chamada “exótica planta”. Tão logo percebeu que a planta era disforme, desajeitada em sua natureza, tratou de podá-la o quanto pôde, tornando-a um ‘quase’ bonsai. A planta já não era mais ela. Ele é que era - o dono da planta.
O ser humano estava tão ocupado em ganhar dinheiro com as exposições, que esqueceu de olhar a planta, com aquele mesmo olhar que um dia a notou, naquela praça desprovida de sol. Não havia mais tempo para outro olhar, senão o das contas bancárias e dos contratos com seres humanos que pagavam para exibirem a planta em seus palacetes e ambientes de grandes negócios. Em pouco tempo, o ser humano deixou de lembrar de regar a planta, e começou sufocá-la em caixas de viagem. Em muitas madrugadas frias, a planta enrijecia os frágeis galhos, expirando parco perfume, perdendo o viço que um dia teve.
A cada exposição, a planta ia murchando, murchando solidão, e o ser humano nem se apercebia. A humanidade inteira acabou assistindo a exposição da planta, mas, por não conhecê-la, não sabia a dor que a planta sofria. Todo ser humano que pagava para admirá-la, precisava chegar cada vez mais perto, aguçar o olfato, e, por fim, tentar imaginar o perfume almiscarado que, diziam, a planta exalava.
Era noite. Os holofotes da última exposição agendada haviam sido desligados. A planta, exaurida, sem perfume algum, exalou a própria morte, sem chamar a atenção da noite humana. Quando amanheceu, nem um ser humano percebeu que era a planta morta, no vaso esquecido em cima de uma caixa de papelão, na mesma praça onde nascera, cheia de perfume. Há quem ainda cruze aquela praça, e sinta a fragrância almiscarada da alma da planta, que já não existe mais.

P.S.: Qualquer coincidência com alguém que você conheça, é coincidência mesmo – ou não... sei lá

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Burburinhos cotidianos

Enquanto a bola rola (nem tão solta) na África, a outra bola (cadinho maior) – o planeta – continua rodando, e fazendo as coisas acontecerem, ou serem acontecidas. Na minha vidinha, tenho presenciado, como toda gente, tantos burburinhos cotidianos, que, pra mim, representam vida, quase sempre desapercebida, que passa... No meio (ou começo, ou fim) de tudo, registro alguns fatos:

De olho na televisão ligada na vitrine da loja de produtos importados, o morador de rua comemora sozinho um gol da seleção brasileira, na Copa 2010. Depois, se afasta, cabisbaixo, olhando pra trás...

Diante do semáforo com sinal vermelho, o motorista resolve parar o carro justamente em cima da faixa de segurança, longe de qualquer olhar policial. No exato momento, o pedestre ‘escala’ o dito carro, atravessando a rua, respeitando a faixa de segurança debaixo do veículo.

O garoto foi esquecido, na sala de aula. No final do turno, a professora trancou a porta, e saiu com os demais alunos, deixando-o lá dentro. O menino sentiu medo, gritou, fez todo barulho que pôde, e acabou mijando na lixeira. Envergonhado e vencido, saltou pela janela do segundo andar da escola.

No meio do caminho, tinha um corpo de passarinho – corpo esquecido, esmagado, comprimido no asfalto...

Um velho maltrapilho remexe na grande lixeira, de onde retira um saco preto rasgado. Escondendo-se entre as poucas árvores do canteiro, o velho lambe as embalagens abertas com voracidade.

Da calçada, pela porta da igreja aberta, pode-se ouvir o pastor: “Aleluia, irmãos! Que importância tem o dinheiro, se podemos ter o reino dos céus?... Doem seus dízimos!”...

A criança chora na calçada, enquanto os pais gritam mais alto: “pare de chorar!”... Na esquina, a criança interrompe o choro, ao enxergar outra criança rindo à direção de um saco plástico vadio que voa com o vento, na avenida em movimento.

No bar da esquina, jogando cartas, um velho diz para o outro: “Isso aí que você contou não aconteceu no nosso tempo”. “O meu tempo é agora!” – responde o outro.

Um cachorro de rua espirra – na rua, claro -, e o corpo dele estremece...

Na estrada:
- Quer carona?...
- Não, obrigado.
- Você nem pediu pra onde vamos.
- Também não sei pra onde vou, mas não quero ir com vocês...

Uma velhinha cruza a calçada, cantarolando Pixinguinha e João de Barro: “...o muito, muito que te quero, e como é sincero o meu amor...”

... e a vida ainda pulsa...

quinta-feira, 17 de junho de 2010

As particularidades do particular

É tempo de liquidação!... Tem pra todos os gostos. Se você dorme de braços abertos, ama a liberdade. Se você usa preto, tem personalidade soturna. Se você isso - é aquilo.
Pior ainda (sempre tem pior), quando as pessoas exageram, nas interpretações mais estapafúrdias. Provavelmente, leram e escutaram tantas ‘merdas’, que chegam soltar absurdos, por todo lugar, julgando toda gente, a partir de um manual que elas mesmas criaram. Se você convive com alguém assim, esteja sempre de prontidão. Enquanto você simplesmente diz (por exemplo) que a temperatura está agradável, amena, a criatura já acrescenta que “você está querendo dizer com isso mais alguma coisa, que é” (e vomita porcarias inimagináveis). Há também aqueles que sempre acham (com certeza) que te aconteceu alguma coisa (fato) – boa ou ruim, sempre alguma coisa fora de você, que te envolveu, comprometeu, e, por isso, você está “assim, ou assado”. É tanta ‘merda’!...
Ah, tem situação pior ainda (previna-se). Quando nada mais resta a ser contestado, a pessoa usa o último (e mais ‘podre’) dos últimos artífices: “Você está dizendo isso, mas teu inconsciente afirma o contrário”. ‘Porra! Baralho!’ Se a frase é dita pra mim, acabou mesmo o papo. Quer saber mais do meu inconsciente que eu mesma? Vá ‘sifu’! Meu inconsciente quer ser deixado em paz, inclusive por mim mesma, pra aparecer, quando bem resolver, ou quando tudo estiver (bem) resolvido – ou não. Do meu consciente, cuido eu – do meu inconsciente, ele se cuida sozinho mesmo.

Você também já deve ter testemunhado cenas como essas:
Cartomante:
- O teu homem está te traindo!
Cliente forçada, ao cruzar na praça:
- Sou irmã de caridade... cá muito entre nós, ainda sou virgem...

No meio de uma reunião, a “grande sábia”:
- Está vendo aquele homem sentado ali atrás, encolhido?... Demonstra ser totalmente inseguro...
A ouvinte ‘sorteada’ entre tantos:
- Pode até ser inseguro, mas está encolhido, por causa das hemorróidas, que não o deixam em paz... ele é meu irmão...

A metida a ‘pepsicóloga’:
- Trabalho, neste departamento, há pouco tempo com você. Mas só de escutar a sua narrativa sobre seu namorado, posso dizer que você está sofrendo de sentimento transferencial. Você deve ser muito mimada pelo seu pai, e quer que seu namorado faça o mesmo.
A futura “ex-colega de trabalho”:
- Nem minha mãe sabe quem é meu pai...

Na festa de aniversário:
- Ah, não, a aniversariante não pode estar vestida de preto!... Vá trocar, querida, vista vermelho, muito vermelho!...
A coitada da aniversariante:
- Obrigada por tantas felicitações, mas fiquei viúva há pouco tempo, e essa não é uma festa, é uma confraternização de agradecimento aos amigos....

Na entrada do cursinho, a garota se despede do namorado motoqueiro. Quando entra na sala de aula, a colega enxerga lágrimas nos olhos da garota, e diz:
- Eu sabia que ele não prestava!... Esqueça aquele salafrário, minha amiga... nem vale a pena chorar por ele...
A garota secando as lágrimas:
- Aquele salafrário acabou de me pedir em casamento!...

Agora, por favor, não imagine que aconteceu alguma coisa comigo, e por isso escrevi o que você ‘cabou’ de ler. Eu escrevi por que escrevi; e você leu por que leu. Não se fala mais nisso. Estamos quites. Particularidades do particular. Ah, essa ‘merda’ toda que escrevi é só ‘merda’ mesmo – ‘merdas’ nem sempre têm causa...

segunda-feira, 14 de junho de 2010

etc etc etc etc

na atual conjuntura dentro do contexto histórico a economia vem evoluindo a partir da conscientização humana que não chega acontecer de fato por motivos distantes do que se pode computar ou prever enquanto o custo de produção inviabiliza a continuidade do processo de revigoramento econômico no livre trânsito do consumo desenfreado e contudo entretanto todavia a palavra economia tem gerado teses estudos e pesquisas que resultam na completa ignorância dos investimentos e consumos imediatistas dentro da carência de grandes projetos de longo prazo que demandariam mais dedicação trabalho e esforço mútuos o que não se aplica hoje em dia em razão de a solidariedade não ser palavra em voga já que os economistas realizam cada vez mais prospectos de vida consumista imediata que acompanham e movem os ideais de mercado sem a interferência dos filósofos antigos e contemporâneos que são soterrados pela atualidade momentânea que consome o tempo das horas de uma humanidade que não sabe somar prazeres na volúpia de degustar o chantilly que provém das máquinas de prazeres imediatos e fugazes a serviço do capitalismo célere que atropela a semente de qualquer sonho simples de uma vida simples sem a parafernália da economia contemporânea que remete ao consumismo impensado e violento desprovido da racionalidade defendida pelos representantes das teorias e práticas da economia global que se contrapõe ao que poderia ser o retorno de valores esquecidos no fundo de obras filosóficas empoeiradas escamoteadas pela atual estrutura social que desestrutura a sociedade desde o micro até o macro social sem a reflexão das conquências possíveis e inimagináveis de serem geradas a cada ser humano vivente na selva das competições cotidianas que arrastam os ideais e forjam desejos transformados em consumismo fácil e deliberado sem quaisquer perspectivas de mudança branda na sustentabilidade existente etc etc etc etc

(‘Puta que pariu’! Quanta ‘merda’ eu fiz aqui! Vou ao banheiro.)

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Abençoadas imperfeições

Confesso que desconfio um pouco (muito) do que parece perfeitinho. Sabe essas coisas de simetria, arte final sem um pingo de erro?... ‘Poizé’. A perfeição, ou o que chamam perfeição, é algo que não encaixa em mim – talvez, por causa das minhas imperfeições, dos meus alinhavos e arremates mal feitos. Sei lá.
Sei o quanto a maioria das criaturas tenta acertar. Também eu tento. Mas não chego ser exemplo de perfeccionismo. Não. Gosto do desafio, da tentativa, do esforço, da dedicação – do exercício. É isso. Nada mais que isso.
Sei lá. A perfeição, como aprendi com as pessoas que convivi, parece alguma coisa certinha demais, irretocável, intocável, inquestionável, e por isso tudo imutável – ável, ável... Uma coisa que me parece morta, por que não requer nem mais um toque, ou olhar, ou qualquer opinião a respeito. É perfeita. Pronto. Fim.
Por outro lado, o que penso mesmo é que a imperfeição é que motiva, impulsiona o ser humano, feito trampolim mesmo. Veja bem, não ‘tô’ aqui escrevendo tratado sobre caráter (também não sou exemplo disso – o caráter que tenho serve pra mim, ninguém mais).
Que todas as imperfeições sejam perdoadas e abençoadas, por que representam tentativas, noites de insônia, estudo, concentração, suor mental, e tudo mais que se sofre, na busca da perfeição que não chega, nem acontece.
Se a gente parar um pouco pra pensar, se debruçar diante de uma frase, uma cena, qualquer coisa concreta, enfim, vai descobrir a imperfeição. Ela (a imperfeição) ‘tá’ sempre lá: na aberração, ou numa vírgula fora do lugar, ou em excesso, um nó mal feito na gravata, um milímetro que teima em pender para um só lado... São tantas imperfeições minúsculas, que chegam quase desaparecer, nas monstruosas perfeições exibidas diariamente.
“Errar é humano” – dizem, mas eu não gosto de justificar meus erros. Errei. Pronto. A ‘merda’ ‘tá’ feita. Saiam de perto, por que vai feder. Só quem tem de ‘guentar’ o mau cheiro sou eu. Legal mesmo é quando a gente consegue acertar, depois da trilhonésima tentativa, já nem tanto otimista... E ainda tem gente que diz que não erra. Talvez, fale isso, por que queira receber o reconhecimento público, pelo esforço que faz pra não errar – o que não exime ninguém de ter cometido o ‘crime’.
Tá bom, você nunca errou, nem erra, nem nunca errará. Você nunca colocou sal (“o tempero da vida”) demais, num prato que pedia sal de menos. Você nunca pisou no rabo do cachorro, que te mordeu em seguida. Você nunca confundiu o nome do (senador) Cristóvam Buarque com o (descobridor) Cristóvão Colombo. Você nunca bebeu uma taça de vinho a mais, e gargalhou sem motivo. Você nunca esqueceu aonde você ia, quando já estava longe de casa. Você nunca admirou o céu, e tropeçou na calçada. Você nunca perguntou à gordinha colega de trabalho quando o filhote ia nascer...
Tá bom, já entendi. Você deve ser um desses caras que a gente só vê, em exibição, nas praças públicas – cheios de empáfia mórbida (e de cocô de passarinho também). Como são chamados mesmo?... ah, sim, estátuas, bustos... paradinhos ali... décadas... séculos... quietinhos, sem cometerem um erro sequer – nem acertos... hehehehehehehehehe

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Ninguém odeia ninguém

Não é que te odeie. Simplesmente não gosto do teu jeito de pensar, falar, vestir, expressar, ouvir, interpretar, caminhar, maquiar, olhar, rebolar, comer, beber, vomitar... Brincadeirinhas à parte, acho que ninguém odeia ninguém. Pode até não gostar (admirar) muita coisa no outro, mas não chega odiar. Não gosta de algumas (ou muitas) coisas, mas não odeia também. É nisso que acredito: ser humano nasceu pra amar - quando não outro ser humano, amar um animal, uma planta, uma pedra, um sei lá o quê (mas amar).
Quando você ouvir alguém gritar “te odeio”, não acredite, mesmo que seja você dizendo isso. O que eu acredito é que alguém não odeia alguém. (Lembrei agora do filme “O Retrato de Dorian Gray”, quando Lord Henry diz: “Acredito em tudo, desde que seja inacreditável”.) Eu acredito que alguém não gostou da atitude, da fala, ou do silêncio, de alguém – mas isso não chega ser ódio. É o que penso.
Pode observar, quando alguém diz que odeia alguém, está, quase sempre, referindo-se a algo específico nesse alguém em questão. Ou esse alguém “odiado” não fez o que alguém “que odeia” esperava que fizesse, ou não disse o esperado, ou simplesmente não correspondeu à expectativa de alguém. Bastou, pra levar um tremendo “eu te odeio” na cara.
Ódio, pra mim, é um termo muito forte (e horrendo), que cheira ‘coisa’ que vai perdurar pra todo sempre. E todo sempre é muuuuuuuuuuuito tempo. E não temos tanto tempo assim - ou ‘tô’ errada?...
Tudo bem, pode até ser verdade real essa ‘coisa’ de reencarnação, etc e tal. Mas, mesmo assim, quando esta vidinha aqui acabar, será o fim de (mais) uma etapa, por que a(s) próxima(s) vida(s) que virá(ão) será(ão) outra(s), com o convívio de outras pessoas, em outras situações. Já não seremos os mesmos – nem no pensar, nem no sentir -, seguindo o pensamento das doutrinas reencarnacionistas, por que teremos evoluído, amadurecido, aprendido alguma coisa a mais.
Por isso, pra mim, essa ‘coisa’ de sair gritando por aí, por aqui, em qualquer lugar, “eu te odeio” é pura besteira. Não há tempo, nem pra amar tanto. E amor, acredito, é pra gente crescer – um com o outro. Imagine, então, se haveria tempo pra “ódios mortais”. Não mesmo. No máximo, ‘entortamos’ as palavras, numa circunstância de raiva extrema, e ‘soltamos’ um “eu te odeio”, que às vezes faz inveja aos melhores atores em cena.
A raiva, acho, é momentânea. Mas, então, você pode estar perguntando: Por que tanta gente deixa de falar com tanta gente, pra “adeus, nunca mais”?... Oras 'carambolas', eu acho que é por orgulho, por que fica difícil voltar atrás, por que pode nem lembrar mais o motivo do distanciamento, mas, sabendo que ele existe, permanece com “pé atrás”, às vezes até esperando que o “alguém odiado” tome a iniciativa de voltar a falar, conviver. Às vezes, por que se perdeu do caminho de encontro com o outro. Por que, acredito, ser humano é isso mesmo: “odeia” tanto hoje, mas amanhã já é outro dia, e sabe que não tem tanto tempo assim, pra continuar “odiando”, “odiando”... Há tanto amor pra fazer, construir, alimentar...
‘Tô’ sendo “Alice no País das Maravilhas”?... Que eu seja. Se eu estiver sendo mesmo Alice, ainda ‘tô no lucro’, por que o novo filme, com Johnny Depp (maravilhoso!), está fazendo o maior sucesso no mundo. Sabe por quê?... Por que o mundo está carente de sonhos, o mundo quer amor, não ódio... todo mundo é assim...

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Tema recorrente

Acho que, enquanto eu estiver viva, vou pensar, e falar, e escrever, sobre um tema recorrente, na minha vida: a morte.
Hoje, parei pra pensar o que penso constantemente: a fluidez da vida. Quando se vê, ou nem se percebe, a morte chega sem avisar. Foi assim com (mais) uma pessoa que conheci. Ela viajava com o marido, para comemorar os 25 anos de casamento. Morreu longe (como se fizesse alguma diferença, se tivesse morrido perto). Morte descabida, como sempre. O casal estava passeando por Fernando de Noronha, e o “buggy” em que estavam ‘virou’ (sem qualquer razão, como se precisasse haver um motivo sequer). Óbito: traumatismo craniano. Só.
Não julgarei se ela era uma criatura boa, ou ruim. Não a conheci tanto. Talvez, nem ela mesma tenha se conhecido o suficiente, pra saber. Ela era – simplesmente. O que falarão dela, a partir de agora, como sempre foi, será pela visão (interpretação) de cada pessoa que a tenha conhecido. Morreu – simplesmente.
Tanto se fala que “a coisa mais certa da vida é a morte”, mas a maioria nem quer pensar nisso. Também eu sou assim, por que morte exala fim, sem ninguém nos pedir licença pra isso. Ontem, convivíamos juntos, e hoje não há mais nós – a vida passa ser, obrigatoriamente, conjugada no singular.
Morte é triste. Mas até a vida – por si só – também é triste. (E ainda há a morte em vida, que devasta mais que a própria morte do corpo humano.)
E se eu morrer amanhã?... Ficarão os projetos, os sonhos, as dívidas, as dúvidas, a vida que eu queria ter vivido. Mas não houve tempo, e eu nem percebia o tempo passar, voar diante da minha janela...
Cá entre nós, eu penso que os sonhos são tão, ou até mais, imprescindíveis que os projetos de vida. Os sonhos nos levam (e elevam) ao impossível. E os projetos são limitados: começo, meio, fim. Você pode até ficar, por algum tempo, sem projeto, mas não vive sem sonhos – pelo menos um sonho, acalentado no fundinho da alma, às vezes carregada de sombras.
Os meus caminhos e descaminhos são o sentido de tudo isso que chamo vida. O exercício de caminhar sempre, pra mim, tem o mesmo valor, ou até mais, do que a chegada – se é que existe a plena satisfação. Por isso (verdadeiro é), eu vivo cada dia como se fosse o último. Não gosto de deixar qualquer coisa para amanhã, por que o amanhã pode não chegar a tempo, e eu nem ter como lamentar a minha morte. Você pode até pensar que estou repetindo velho bordão, mas não é só isso.
Se hoje eu soubesse que iria morrer amanhã, provavelmente, eu tentasse 'esticar' o tempo, as horas, fazer coisas que nunca pensei fazer, e até coisas que pensei, e não fiz. Mas o tempo seria o mesmo cronometrado no planeta, enquanto, em mim, esse mesmo tempo seria intenso, profundo, como se, de fato, fosse mais vivido. Mas não sei se morrerei amanhã, nem tenho a garantia de que continuarei viva. Por isso, não quero me ocupar com isso agora. Não há tempo.
Particularmente, eu vivo o meu tempo.
Alguns querem viver tudo o que a vida oferece; outros são comedidos na vida, e por isso vivem concentrados numa única vida. De minha parte, nem penso que vivo, mas acho que participo de vidas que não são minhas. Nesta “colcha de retalhos”, algum alinhavo meu denuncia que estou viva.
E se eu morrer amanhã?... Ficarão alguns rabiscos, na minha opinião, ininteligíveis, e alguma história inacabada, e com isso, e por isso, e apesar disso, mal contada. Morrerei soterrada por tentativas vãs – inclusive, a de viver. E não restará nada mais além disso – o que permanecerá somente por algum tempo, que já não será mais meu. Mas isso não chega ser triste, por que caminhei. Nunca cheguei a lugar algum. O sonho faz sentido à vida minha.