quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Pão & circo


Pelo visto, nos últimos dias, muitos brasileiros perderam os horários dos ônibus, dos trens, para o trabalho – tudo por conta de acompanharem o julgamento do jovem que assassinou a ex-namorada, há três anos, no estado de São Paulo. Não vou falar sobre o crime, nem citarei nomes – a mídia nacional já se apropriou do estardalhaço todo. Incrível, o fato foi transmitido, ao vivo, em 2008, com desfecho trágico (a morte de uma adolescente de 15 anos), o criminoso preso, e nunca mais se falou sobre isso. Esta semana, a mídia retomou o caso, com a divulgação do julgamento, que iniciou segunda-feira, e só teve o veredicto, no final da tarde de hoje.
Não quero me deter no que a mídia mostrou, no que era (somente) para ser visto – nem nos fatos, nem na repercussão deles. O que lamentei foi ter enxergado tanta gente (que também deve trabalhar, estudar, viver a própria vida) arrumando tempo e disposição, para ficar 'acampada', por horas, na frente de um fórum de justiça, acompanhando o julgamento de mais um criminoso (desconhecido pela maioria).
Evidentemente, até o público que não costuma pensar observou o sensacionalismo coletivo dos profissionais(?) da imprensa brasileira, em relação ao julgamento. Toda mídia foi unânime, ao citar, nos noticiários, “comoção nacional”, sobre o fato. Não foi isso que acho que vi – eu, mais uma cidadã do mundo, profissional do jornalismo “fora de moda”, dos tempos em que havia preocupação, sim, com a informação, mas, mais ainda, com a formação de opinião.
As imagens que assisti, pela televisão, me fizeram lembrar a política “panis et circenses”, adotada pelo império romano. Os políticos espertinhos já se revelavam, séculos antes do nascimento de Jesus Cristo – a historinha é contada e recontada até hoje. O povo recebia pães, na entrada das apresentações de lutas entre gladiadores, com a participação de alguns animais (mais) ferozes (tigres, leões), durante o show sanguinolento. Assim, a plebe comia pães e se distraía, no circo armado, aplaudindo os promotores dos espetáculos. Pão e circo – os tempos romanos voltaram, e poucos querem pensar sobre isso.

Daqui a 98 anos e dez meses (condenação do réu), a mídia não vai desenterrar o caso. Os pães serão feitos de outra massa. O circo apresentará outros espetáculos.

Um comentário:

  1. A mídia é mesmo imediatista. Armam o circo e expõe os fatos apenas para ter audiência e repercussão. Quanto mais triste é a história, mais as pessoas se comovem, acompanham e ficam sedentas por mais detalhes.
    Como, em geral, a maioria das pessoas não faz nada mais além disso, eu percebo um pouco de sordidez e masoquismo nisso. Parece que uma busca por peças que completam a figura, dão 'uma visão geral' (que e o que as pessoas acham que tem, mas na verdade não passa de uma visão superficial) e essa visão é fornecida através do senso comum.
    E, realmente, se há circo montado e pão sendo distribuído é porque há uma platéia, há um público com o qual eles podem contar pra isso.
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    Muito bom seu texto. Até o próximo post.

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