terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Minha capacidade é tua




Às vezes sempre, olhamos o outro, como se estivéssemos diante de um espelho, o que raramente, aí sim, reconhecemos. Se o outro é amigo, julgamos conhecê-lo, e, também por isso, imaginamos o que ele (o outro) pensa, gosta, desgosta. Se o outro é inimigo, não agimos diferente, quando supomos a capacidade dele (o outro). Nesses instantes tão humanos, esquecemos de nós mesmos – o princípio e o fim de tudo e nada.
Capazes?... Capazes todos nós somos. Capazes de tudo, “a qualquer momento, em edição extraordinária”. Quando você imagina (julga) a minha capacidade, ela (a capacidade) não é minha – é tua. Não importa se você está enxergando a capacidade de amar, ou odiar, matar, construir. Não interessa mesmo o verbo que faz par com a ‘dona capacidade’ (tua, não minha). O mesmo faço eu, quando conjecturo sobre a tua capacidade, ou sei lá de quem.
Esse espelho diário – o outro -, que nos acompanha a vida inteira, e fica diante de nós (às vezes, a criatura mais adorável, outras, a mais odiável), é a gente mesma se olhando, e pressupondo que sabe do outro. E até vamos mais longe. Quando se está em “pé-de-guerra” com alguém, a gente observa o mínimo gesto desse alguém. Quando menos se espera, a gente é que ‘ataca’, por ter imaginado que o outro iria ‘atacar’ (com palavras, ou atitudes, ou ‘ambas as duas’ coisas). Tem gente que vai mais longe ainda, chegando usar, ou inverter, manifestações do outro contra ele (o outro).
Se o outro (nosso espelho) é amigo, tá de aniversário (exemplo aleatório), vamos em busca do que julgamos ser o melhor presente a ele. Com o que podemos gastar, procuramos dvds, por que o amigo gosta de filmes. Mas que filme dar (são tantos)?... Assim que entramos na loja, enxergamos o dvd daquele filme que o amigo riu a valer, naquela cidadezinha do interior, depois de tomarmos aquele porre juntos. Compramos o ‘belo presente’, imediatamente, e saímos da loja, satisfeitos, felizes até. Em casa, tudo o que o amigo aniversariante quer é esquecer aquela viagem, e tudo o que aconteceu – o carro enguiçado, a goteira no quarto da pensão, o ‘gosto de cabo de guarda-chuva’ da ressaca, incluindo o dito filme que serviu de presente nosso...
E quando alguém conta uma circunstância extrema que viveu?... Quase sempre, tem outro alguém pra dizer: “Ah, se fosse comigo, eu faria isso, aquilo, aquel’outro”... Será?... Sei não. Como a mãe do Forrest Gump (filme lindo) disse, a vida é uma caixinha de bombons... Vivenciar alguma coisa, penso eu, é sofrer (sentir) todo o ambiente (situação), fazer parte da cena inteira, ter como colegas, até os ácaros do tapete, das cortinas. Se chega de repente, pra sair em seguida, é ator amador, coadjuvante contratado na última hora, pra substituir aquele que quebrou a perna. Nada mais, nem menos.
“Fulano é capaz de matar”. “Beltrano é capaz de morrer, por causa disso”. “Cicrano é capaz de fazer muito mais, pra ter sucesso”. Fulano, beltrano, cicrano, ou o escambau, são capazes de tudo, o tempo todo. Se eu delimito, por medo, ou a ‘merda’ que for, a capacidade imputada é minha, não de beltrano, fulano, cicrano. Acabou.

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