Quem pensa que vida fácil é uma das profissões mais antigas da humanidade, engana-se profunda e injustamente. Não argumento a respeito, nem ouso me deter em detalhes que desconheço, da vista do ponto das trabalhadoras do sexo, que sabem que a vida delas também não é nada fácil.
Resta, então, pensar na infância, como vida fácil. Que nada! A infância – a primeira, mais ainda – deve ser comparada a um dos piores filmes trash que se tem notícia. Ainda bem que esquecemos da nossa primeira infância. Só imagine um mundaréu de gentes em cima de você, na maior catarse humana. Cegueira demais. Expectativas demais. Fantasia demais. Esperança demais. Enquanto cada qual pensa no próprio umbigo, o bebê, se pudesse pensar, pensaria só no cordão umbilical que perdeu. Ele chora a falta, chora por não saber, e choraria mais ainda, se soubesse. Nem pensar. Nos primeiros meses, surgem cólicas, mal-estar no corpo todo. A coisa só piora, quando o infante começa a caminhar (correr), falar, enxergar o mundo e as pessoas, raciocinar. De lá para cá, a coisa só desanda. Não podia ser diferente. E ainda crianças são esquecidas dentro de carros trancados, em estacionamento.
Depois de ser expulso do paraíso (útero), o bebê sofre o primeiro e mais dolorido impacto: viver. O pior é que quase tudo da própria sobrevivência não depende dele – só mesmo o respirar, sem saber que respira. Por isso, a primeira linguagem é chorar – só mesmo na primeira infância, os adultos, ao redor, fazem tudo para acabar com o choro infantil. O tempo passa, até que chega a nova ordem, sem exceção: proibido chorar. A criança tem de aprender a caminhar, falar, comer, beber, fazer gracinhas para os adultos – em tudo isso, vai aprendendo a raciocinar, mas poucos adultos percebem esse detalhe. Vale lembrar: nos países sempre em guerra, crianças também nascem – e vivem, e são mortas. Nos países onde a guerra é camuflada, atrás dos muros da hipocrisia, recém-nascidos são embalados em sacos plásticos, e abandonados em lixeiras. Vida fácil – quando, aonde?…
Após, vem ainda a adolescência – fase triste, melancólica, período das maiores incertezas (pelo menos, assumidas). Talvez, seja uma das épocas da vida em que a gente mais questiona – tudo e todos. Com a lentidão do tempo (demora a passar), a maioria se acomoda, torna-se subserviente do adulto, e aluga uma quitinete, na zona de conforto mais próxima, e rende-se ao consumismo. Tanta coisa acontece, nesta fase: o adolescente é grande para os pequenos, e pequeno para os grandes. Como se houvesse necessidade de 'uma mãozinha', os adultos ainda dizem ao adolescente “não faça isso, você não é mais criança”, para, numa outra situação, falarem “você é apenas uma criança”. Por isso, o adolescente se desespera tanto: sofre com os menores, e não compreende os maiores. Sabe, sem saber, que não é igual aos irmãos, nem aos pais, nem a ninguém. Busca ser diferente – acaba descobrindo que somos iguais e diferentes, o tempo todo. E ainda precisa ser o primeiro da classe, o primeiro no futebol, a primeira a usar maquiagem e salto alto, o primeiro a beijar na boca, a primeira no balé, o primeiro no videogame, o primeiro a perder a virgindade, o primeiro a receber diploma, o primeiro da família, o primeiro da escola, o primeiro da turma. Tem de escolher uma carreira profissional promissora, correspondendo ao que os adultos esperam dele. Se for pobre e negro, o adolescente sofre ainda mais, nem sempre escapando das balas perdidas, as quais, coincidentemente, acham sempre o mesmo alvo. Tudo – nada fácil.
A fase adulta chega, fazendo escândalos revolucionários – só no começo -; em seguida, o fogo de palha não deixa sequer lembrança. A criança que sonhava tornar-se super herói, o adolescente que queria mudar o mundo simplesmente são deixados de lado pelo adulto, que só quer saber de alimentar-se de imagens, poder($) e fama. Se o adulto é pobre e negro (conseguiu sobreviver às balas perdidas da adolescência), certamente, é o primeiro suspeito de cometer todos os crimes. Por isso, é linchado pela sociedade moralista, e/ou permanece preso, sem julgamento. Se for ator global, pode ser liberado da cadeia, sem pedido de desculpas.
Mas o que o adulto mais deseja mesmo é ser bem-sucedido – no peso e na medida ditados pela sociedade. Nas redes sociais, todo mundo exibe felicidade desconhecida de todo mundo. O adulto quer pertencer aos grupos, e, por isso, tenta imitá-los, para, depois participante, mostrar-se melhor que os demais. Os adultos convivem com outros adultos, que reproduzem vidas aparentes de outros adultos. Por isso, adulto perde o sono, trabalha e consome demais, querendo compensar o que não teve e o que não fez, deixando de fazer e abandonando tantas coisas da essência humana. E ainda quer ser melhor que os outros (adultos), sem saber quem ele mesmo (adulto) é. Não sabe que o que vê, não enxerga, e quer convencer os outros (adultos) para olharem o que ele (adulto) aparenta ser. Nesse processo exaustivo, quase impensado, o adulto está sendo exemplo, às crianças e aos adolescentes. Até poderia ser vida fácil, se fosse outra vida: adulta.
Tem mais. O tempo (algoz) não deixa por menos: logo no início da velhice, entrega o veredito da vida: fim da linha. Enquanto alguns escolhem seguir vivendo, aprendendo com a nova etapa, outros tentam fazer o que sempre quiseram, tanto, que, às vezes, acabam exagerando no botox, nas cirurgias plásticas, no excesso de bebidas e/ou comidas. Tem aqueles que seguem, se arrastando, numa vida concentrada nas dores que o tempo faz latejar no corpo. Junto com a velhice, podem chegar, também, o abandono, o desamparo. Quem quer saber de um velho caquético, fora de moda, que esquece tudo, e só lembra do próprio passado, cada vez mais distante?… Ainda assim, os velhos persistem – vida nada fácil.
Apesar de desejarem estar numa outra fase da vida, fazer parte de uma outra época dessa história mal contada, todos vivem – e morrem.
Nem sempre a grama do vizinho é a mais verde. A vida não é fácil, para ninguém, mas pode tornar-se insuportável, para todos, quando o adolescente escolhe ser adulto, antes do tempo; o adulto resolve ser bebê, bem depois do tempo; e quando todos exigem que o bebê se comporte como adolescente, muito antes do tempo, sem que o pequeno saiba disso. Não dá. O velho, quase sempre, quer voltar a ser criança, enquanto o adulto deseja ser jovem, e o adolescente quer tornar-se adulto. Somente o bebê (ainda) não sabe que pode querer, desejar. Na realidade, todos sonham: liberdade e segurança. Mas são tantas as exigências – internas, externas.
E ainda tem gente que imagina que estamos neste planeta, de férias, ou a passeio…
Vida fácil? Que eu conheça e saiba, só mesmo a da samambaia que eu rego e trato – existe, sem saber que existe, e sequer ocupa espaço de exibição, para julgamentos públicos.
Num ínterim qualquer dessa vida sempre tão frágil: game over.
Resta, então, pensar na infância, como vida fácil. Que nada! A infância – a primeira, mais ainda – deve ser comparada a um dos piores filmes trash que se tem notícia. Ainda bem que esquecemos da nossa primeira infância. Só imagine um mundaréu de gentes em cima de você, na maior catarse humana. Cegueira demais. Expectativas demais. Fantasia demais. Esperança demais. Enquanto cada qual pensa no próprio umbigo, o bebê, se pudesse pensar, pensaria só no cordão umbilical que perdeu. Ele chora a falta, chora por não saber, e choraria mais ainda, se soubesse. Nem pensar. Nos primeiros meses, surgem cólicas, mal-estar no corpo todo. A coisa só piora, quando o infante começa a caminhar (correr), falar, enxergar o mundo e as pessoas, raciocinar. De lá para cá, a coisa só desanda. Não podia ser diferente. E ainda crianças são esquecidas dentro de carros trancados, em estacionamento.
Depois de ser expulso do paraíso (útero), o bebê sofre o primeiro e mais dolorido impacto: viver. O pior é que quase tudo da própria sobrevivência não depende dele – só mesmo o respirar, sem saber que respira. Por isso, a primeira linguagem é chorar – só mesmo na primeira infância, os adultos, ao redor, fazem tudo para acabar com o choro infantil. O tempo passa, até que chega a nova ordem, sem exceção: proibido chorar. A criança tem de aprender a caminhar, falar, comer, beber, fazer gracinhas para os adultos – em tudo isso, vai aprendendo a raciocinar, mas poucos adultos percebem esse detalhe. Vale lembrar: nos países sempre em guerra, crianças também nascem – e vivem, e são mortas. Nos países onde a guerra é camuflada, atrás dos muros da hipocrisia, recém-nascidos são embalados em sacos plásticos, e abandonados em lixeiras. Vida fácil – quando, aonde?…
Após, vem ainda a adolescência – fase triste, melancólica, período das maiores incertezas (pelo menos, assumidas). Talvez, seja uma das épocas da vida em que a gente mais questiona – tudo e todos. Com a lentidão do tempo (demora a passar), a maioria se acomoda, torna-se subserviente do adulto, e aluga uma quitinete, na zona de conforto mais próxima, e rende-se ao consumismo. Tanta coisa acontece, nesta fase: o adolescente é grande para os pequenos, e pequeno para os grandes. Como se houvesse necessidade de 'uma mãozinha', os adultos ainda dizem ao adolescente “não faça isso, você não é mais criança”, para, numa outra situação, falarem “você é apenas uma criança”. Por isso, o adolescente se desespera tanto: sofre com os menores, e não compreende os maiores. Sabe, sem saber, que não é igual aos irmãos, nem aos pais, nem a ninguém. Busca ser diferente – acaba descobrindo que somos iguais e diferentes, o tempo todo. E ainda precisa ser o primeiro da classe, o primeiro no futebol, a primeira a usar maquiagem e salto alto, o primeiro a beijar na boca, a primeira no balé, o primeiro no videogame, o primeiro a perder a virgindade, o primeiro a receber diploma, o primeiro da família, o primeiro da escola, o primeiro da turma. Tem de escolher uma carreira profissional promissora, correspondendo ao que os adultos esperam dele. Se for pobre e negro, o adolescente sofre ainda mais, nem sempre escapando das balas perdidas, as quais, coincidentemente, acham sempre o mesmo alvo. Tudo – nada fácil.
A fase adulta chega, fazendo escândalos revolucionários – só no começo -; em seguida, o fogo de palha não deixa sequer lembrança. A criança que sonhava tornar-se super herói, o adolescente que queria mudar o mundo simplesmente são deixados de lado pelo adulto, que só quer saber de alimentar-se de imagens, poder($) e fama. Se o adulto é pobre e negro (conseguiu sobreviver às balas perdidas da adolescência), certamente, é o primeiro suspeito de cometer todos os crimes. Por isso, é linchado pela sociedade moralista, e/ou permanece preso, sem julgamento. Se for ator global, pode ser liberado da cadeia, sem pedido de desculpas.
Mas o que o adulto mais deseja mesmo é ser bem-sucedido – no peso e na medida ditados pela sociedade. Nas redes sociais, todo mundo exibe felicidade desconhecida de todo mundo. O adulto quer pertencer aos grupos, e, por isso, tenta imitá-los, para, depois participante, mostrar-se melhor que os demais. Os adultos convivem com outros adultos, que reproduzem vidas aparentes de outros adultos. Por isso, adulto perde o sono, trabalha e consome demais, querendo compensar o que não teve e o que não fez, deixando de fazer e abandonando tantas coisas da essência humana. E ainda quer ser melhor que os outros (adultos), sem saber quem ele mesmo (adulto) é. Não sabe que o que vê, não enxerga, e quer convencer os outros (adultos) para olharem o que ele (adulto) aparenta ser. Nesse processo exaustivo, quase impensado, o adulto está sendo exemplo, às crianças e aos adolescentes. Até poderia ser vida fácil, se fosse outra vida: adulta.
Tem mais. O tempo (algoz) não deixa por menos: logo no início da velhice, entrega o veredito da vida: fim da linha. Enquanto alguns escolhem seguir vivendo, aprendendo com a nova etapa, outros tentam fazer o que sempre quiseram, tanto, que, às vezes, acabam exagerando no botox, nas cirurgias plásticas, no excesso de bebidas e/ou comidas. Tem aqueles que seguem, se arrastando, numa vida concentrada nas dores que o tempo faz latejar no corpo. Junto com a velhice, podem chegar, também, o abandono, o desamparo. Quem quer saber de um velho caquético, fora de moda, que esquece tudo, e só lembra do próprio passado, cada vez mais distante?… Ainda assim, os velhos persistem – vida nada fácil.
Apesar de desejarem estar numa outra fase da vida, fazer parte de uma outra época dessa história mal contada, todos vivem – e morrem.
Nem sempre a grama do vizinho é a mais verde. A vida não é fácil, para ninguém, mas pode tornar-se insuportável, para todos, quando o adolescente escolhe ser adulto, antes do tempo; o adulto resolve ser bebê, bem depois do tempo; e quando todos exigem que o bebê se comporte como adolescente, muito antes do tempo, sem que o pequeno saiba disso. Não dá. O velho, quase sempre, quer voltar a ser criança, enquanto o adulto deseja ser jovem, e o adolescente quer tornar-se adulto. Somente o bebê (ainda) não sabe que pode querer, desejar. Na realidade, todos sonham: liberdade e segurança. Mas são tantas as exigências – internas, externas.
E ainda tem gente que imagina que estamos neste planeta, de férias, ou a passeio…
Vida fácil? Que eu conheça e saiba, só mesmo a da samambaia que eu rego e trato – existe, sem saber que existe, e sequer ocupa espaço de exibição, para julgamentos públicos.
Num ínterim qualquer dessa vida sempre tão frágil: game over.
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