Sinceramente?
Penso que a gente adulta vem, ou vai, perdendo a memória. Esquecemos
que ninguém nasce racista, homofóbico, criminoso, assassino. Por
esquecimento, continuamos permitindo (sempre escolha) que mais
crianças cresçam nas ruas, em completo desamparo. Isso não é
culpa de governo, ou qualquer outro poder instituído, seja no
Brasil, ou até mesmo na ilha de Tristan da Cunha, o lugar mais longe
do mundo. Na realidade, a culpa nem existe - o que deveria haver
seria uma outra coisa: responsabilidade humana. Para acabar com
qualquer esperança de conscientização, ainda confundimos conceitos
e práticas: família educa; escola ensina.
Conseguimos
ser piores, quando separamos nossos filhos dos filhos de ninguém,
dizendo que não existe a menor comparação. Acredite, nenhuma
criança nasce de um pé de repolho, ou pimenta. Esquecemos (o que
deveríamos saber, antes mesmo das vogais do alfabeto) que crianças
são crianças, em qualquer condição, em qualquer lugar do mundo -
têm sonhos, desejos e medos -, e crescem, tornam-se adultas.
Continuamos todos assim - sonhadores e medrosos.
Por
isso, pra mim, Dia da Criança só é feliz, quando a criança se
sente feliz, tem alegria de viver. O resto é marketing, engodo, para
não nos sentirmos culpados, responsáveis pelas crianças que vemos
nas praças, debaixo de pontes e viadutos, nas ruas, nos semáforos.
Eu venho lembrar isso: São crianças, sim. Nem sempre as carinhas
estão lavadas, os cabelos penteados e cortados, as roupas limpas e
com etiquetas. Mas continuam sendo crianças. A maioria desses
menores, filhos de ninguém, nem sabe que é infeliz, por que
desconhece esse tipo de parâmetro, ou exemplo. A maioria até tenta
parecer feliz, criando brincadeiras, no meio da rua. Mas nem um olhar
adulto se interessa por isso. A maioria dos maiores, quando se depara
com essas crianças “mulambentas”, o mínimo que faz é proteger
a carteira, o bolso, a bolsa, o celular última geração, proteger o
que tem e o que aquele ser quase invisível provavelmente nunca terá.
Tem
gente (boazinha) que ainda mantém o hábito (caridoso) de preparar
pacotes com doces e brinquedos, e distribuí-los em instituições
que abrigam e atendem crianças. Já tentei fazer isso, também. Não
deu certo, quando ouvi uma senhora, que atendia num orfanato, dizer
que, tanto quanto podia, guardava alguns pacotes de balas e
pirulitos, para entregar às crianças, pelo menos uma vez por mês,
mesmo quando a validade já havia sido vencida pelo tempo. Compreendi
que aquela senhora queria manter viva a chama de esperança, naquelas
dezenas de crianças. Foi quando desisti da caridade com hora
marcada.
Somos
tão inteligentes e hábeis, que sabemos lidar com toda essa
altíssima tecnologia que nos assalta, diariamente. Também, sabemos
que, lá fora, até as ruas, ou o mais simples banco de praça,
quando não recebem atenção e cuidado, acabam deteriorando. Um
parque que não é limpo é invadido, em pouco tempo, por ervas
daninhas. Por isso, cuidamos dos parques, das ruas, dos bancos de
praça. Se você leu até aqui, pode estar perguntando: E as crianças
em condição de rua?... Eu respondo: continuam invisíveis, ao nosso
olhar cego de quem não tem a ver com isso, nem quer pensar a
respeito.
Ah,
claro (quase esqueci): Daqui a pouco, será 12 de outubro: Feliz Dia
da Criança Feliz! Por que as crianças infelizes continuarão sendo
infelizes, até que a gente escolha fazer alguma coisa, para mostrar
que a felicidade pode realmente existir (pra nós, e para os outros),
quando a gente exercita sobrepor o próprio umbigo.
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