A vida pode ter mesmo sabor de caramelo. Acredito nisso,
por que alguém me mostrou, há muito tempo, na minha infância cheia
de observações, sabores, cheiros, imagens, que o o melhor da vida
pode ter sabor de caramelo: meu pai.
Muito mais que falar, meu pai colocava valores, na vida,
que, se você não lhes dá atenção, nem os percebe. Foi assim que
cresci, na companhia de meu pai: observando tudo, silenciosamente, e
aprendendo. Se sempre falo do meu pai, é por que ele foi meu
primeiro mestre da vida, na minha vidinha. Depois, tive outros
mestres, que me mostraram tantas paisagens, tantos caminhos. Mas foi
com meu pai que aprendi a buscar sempre meu olhar microscópico, sem
me deter, me perder, na aparência, na casca, no invólucro.
Lembro, agora, quando meu pai, já aposentado, criou um
hábito vicioso: comprava sempre pacotes de caramelos. Nada de
caramelos linda e separadamente embalados. Não. Eram caramelos
comuns – multicoloridos, mas sempre os mais baratos. Comprava um,
ou dois quilos, e íamos para casa, chupando caramelos. O sabor era
especial – talvez, puro açúcar -, por que tinha o sorriso do meu
pai, naquele olhar acinzentado.
Já disse que meu pai não verbalizava tudo – as
atitudes eram mais as palavras dele. Foi meu pai que me ensinou, com
os exemplos que dava, naturalmente, a buscar o melhor das pessoas.
Havia, nos olhos de meu pai, uma esperança na humanidade, que me
encantava, e até me fazia acreditar que nem tudo estava perdido, que
podíamos nos tornar melhores – todos, todos nós, seres humanos.
Entre um caramelo e outro, meu pai, às vezes, falava da
infância dele, quando lembrava ter vendido, de porta em porta,
verduras, legumes, frutas. Depois, recordava os tempos de exército,
dos exercícios físicos forçados na neve. Ah, mas o melhor sempre
ficava por último, na conversa com sabor de caramelo. Meu pai
contava sobre as viagens dele, conduzindo trens (por mais de 30 anos,
foi maquinista). Quantas paradas de trem meu pai fez, de madrugada,
no meio do nada, só para tomar chimarrão, “no ar fresco e puro da
noite” - dizia ele. Mas, também, haviam as caçadas de pequenos
animais do mato, além da pesca em algum “lugar perdido cheio de
água limpa”. Depois, feito menino cansado de brincar, meu pai
retornava ao trem, e continuava conduzindo a grande viagem.
Antigamente, os trilhos dos trens não tinham pressa, passeavam no
meio do mato, adentravam lugares silenciosos e sombrios, para depois
se depararem com o nascer do sol.
Ainda sinto o sabor daqueles caramelos que alegravam a
alma infantil do meu pai, que, numa noite, seguiu a viagem mais
surpreendente da vida - nós todos também trilharemos...
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