Na
minha insignificante opinião, eles estão cada vez mais surdos - e
vocês continuam atuais, Erasmo Carlos e Roberto Carlos, autores da
música com esse título aí de cima. Mas o que a maioria não quer
saber mesmo é escutar o outro, os outros. Por isso, tem tanta gente
que se sente falando sozinha - não é uma questão de sentir-se,
mais que isso, está falando sozinha mesmo, por que ninguém quer
escutar. Aliás, o que todo mundo deseja é falar e ser ouvido - sem
contar todo o tipo de interpretações que pode sofrer, depois que
fala.
Mas
poucos, cada vez mais raros (valiosos), querem escutar. A realidade é
que os surdos (grande maioria) estão cada vez mais falantes, e ainda
dizem: “você não me falou”, o que poderia ser traduzido para
“eu não escutei você”. Pelo menos, seria real.
Tenho um amigo que, há alguns
meses atrás, quis fechar o escritório que tinha, para viajar,
estudar. Planejou tudo, durante meses. O que ele não previu foi o
incidente com a secretária. Como meu amigo tinha de entregar o
imóvel, naquela semana, chamou a secretária, para comunicar-lhe
que, como já havia dito a ela, informalmente, estava fechando o
escritório.
A secretária entrou na sala do
patrão, com papeis, a serem assinados por ele, e a agenda dos
telefonemas que atendera. Ela falava tanto, repetindo as tarefas, que
meu amigo simplesmente perdeu a batalha: não conseguiu frear aquela
cantilena, mesmo depois de ter quase gritado. “Ela não me ouvia”,
reclamou meu amigo, enquanto contava que foram três dias assim: a
secretária cumprimentava-o, quando ele chegava ao escritório, e
depois adentrava à sala dele, falando, falando sem parar.
Derrotado, meu amigo não teve
opção: entregou a sala, no início de uma noite, e encaminhou a
papelada toda de demissão da secretária, com o devido pagamento, ao
advogado contratado por ele. Depois do relato, perguntei, irônica:
Você a viu, depois disso?... E ele, gargalhando, contou que, algum
tempo depois, escutou um “rosário de reclamações”, no balcão
de uma empresa aérea. Era a ex-secretária do meu amigo, que não
deixava mais ninguém falar - nem ouvia que o voo dela já havia
partido, enquanto ela gritava e gesticulava para um pobre atendente,
que assentia com a cabeça, mudo, depois de desistir de ser escutado.
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