Pensar
só em si mesmo. Querer fazer e participar somente do que lhe dá prazer, status
e poder. Criar imagens de si mesmo, sem falhas e características de maldade, ou
ignorância, para ser amado e idolatrado. Tudo isso parece ser caraterístico do
individualismo, que predomina nos tempos atuais. Pode até ser – nem sempre.
Às
vezes, a psicopatia se esconde tanto, nessas pessoas egocêntricas, que ninguém
identifica – nem elas mesmas. Nascem, são estimuladas pela sociedade, e até
morrem assim: sem diagnóstico. Por que psicopatia não é doença –
consequentemente, não tem tratamento, nem cura. Psicopatia, dá pra dizer isso,
seria um desvio de caráter, de personalidade. Simplesmente, no caso, a criatura
não enxerga o outro, não há qualquer empatia nela.
Não
havendo patologia, a psicopatia apresenta sintomas sérios, e consequências
maiores ainda. Tenho me dedicado, há algum tempo, a estudar a respeito. O que
percebi, sem conclusão, até aqui, é que o caso é mais sério do que se possa
imaginar. Por isso mesmo, duvido muito que algum ser humano vivente não tenha
conhecido, ou convivido, com um psicopata.
Quantas
vezes, passamos noites em claro, lembrando e julgando nossos próprios atos,
assumindo a responsabilidade que, parece, nos cabe, no que diz respeito a
relacionamentos. Nem sempre, a responsabilidade pelos ‘acidentes de percurso’,
numa relação, é nossa. O outro, seja quem for, pode até nos imputar o título de
causadores da tragédia, o que nos toca, profundamente, quando somos
exageradamente autocríticos. Mas não podemos concluir que somos os piores dos
piores, só por que alguém resolve acabar com a nossa ‘raça’. Às vezes, nem
existe culpa, ou culpado(s). O que sempre existe é escolha – e consequência,
claro.
Certamente,
nem toda atitude egoísta pressupõe (mais) um caso de psicopatia. Fique
tranquilo, se, na maior parte de sua vida, você prioriza você mesmo, por motivos
de medo, insegurança, autoproteção, ou seja lá qual for a justificativa que
você usa para si mesmo. O psicopata, pelo que já li, não quer nem saber o que
pode existir além do próprio umbigo, e, por isso mesmo, não pensa no outro. Sempre
repito que não há como colocar-se no lugar do outro, que está completamente
ocupado (pelo outro, obviamente). Mas sempre há um jeito de, através de nossas
semelhanças humanas, sabermos o que faz bem, o que faz mal, perto de nós, ou na
Ilha de Java, ou no Azerbaijão – desde a mais tenra idade, começamos a
compreender isso.
A
psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva é, a meu ver, quem mais esclarece sobre
psicopatia. Ela é autora de diversos livros, com o objetivo de chamar a atenção
dos leitores sobre manifestações humanas distorcidas e doentias. Um desses
livros chama-se “Mentes Perigosas – O Psicopata Mora ao Lado”. Lembrando que o
indivíduo carrega, na própria genética, as características de psicopatia, Ana
Beatriz esclarece que “a índole da pessoa já vem, geneticamente, com essa
tendência à perversidade”. No livro, ela cita casos, onde crianças não
manifestam compaixão, quando maltratam animais, fazem brincadeiras perversas
com coleguinhas, e sentem prazer de ver o outro cair, se machucar, etc. A
psiquiatra alerta que, somente na infância, há condições de minimizar os
efeitos da psicopatia, impondo limites.
Dra.
Ana Beatriz Barbosa Silva explica, ainda, que, quando se torna adulto, “todo
psicopata é megalomaníaco, gosta de exibir a sua esperteza, e está sempre se
vitimizando, contando histórias tristes, e se dizendo vítima da sociedade”.
Outra característica dos psicopatas, conforme a psiquiatra, é que “são sempre
pessoas simpáticas, gentis, educadas, até você estar fazendo tudo o que elas
querem. No momento em que você começa a deixar claro que está percebendo o jogo
dele, o psicopata pode até se tornar violento. Então, psicopatas são pessoas
que mudam o comportamento, conforme são revelados. Uma outra característica
fundamental é a ausência de culpa. Essas pessoas nunca se arrependem do que
fazem”. Nem todos os psicopatas são violentos; nem todos os violentos são
psicopatas. A psicopatia perpassa pelos níveis leve, moderado e grave.
A
psiquiatra destaca, ainda, que “a internet abriu um grande campo, para que a
psicopatia pudesse se proliferar. Eu costumo dizer que existe um porão de
psicopatas atuando na internet, hoje, existe mesmo, existem comunidades que
você não acredita, na internet. E isso se fez muito, por que eles se valiam do
anonimato. Um psicopata, no anonimato, pode ser quem ele quer, quem o outro
quer que ele seja, e ele – o psicopata – sabe fazer isso, melhor do que ninguém,
por que é o verdadeiro grande artista da vida, por que ele se transforma
naquilo que as pessoas querem. Você ser camaleão (termo dado ao psicopata, na
Espanha), num universo sem leis, sem regras, onde o que vale é o que você diz,
onde você pode forjar e fingir, a internet é um prato cheio”.
Ana
Beatriz aconselha a gente a não dar tempo de detectar o grau de psicopatia, e
manter distância: “Nunca ache que você vai mudar um psicopata. Nunca menospreze
o poder de sedução de um psicopata: ele vai te seduzir. A melhor coisa é se
afastar”. Explica a psiquiatra: “Os psicopatas nascem com um cérebro diferente.
Os seres humanos têm o chamado sistema límbico, a estrutura cerebral
responsável por nossas emoções. É uma espécie de central emocional, o coração
da mente. Nos psicopatas, o sistema límbico não funciona”. Ana Beatriz chama a
nossa atenção: “Há algumas características básicas, entre os psicopatas: falam
muito de si mesmos, mentem, e não se constrangem quando descobertos, têm
postura arrogante e intimidadora, por um lado, mas são charmosos e sedutores,
por outro. Costumam contar histórias tristes, em que são heróis e generosos”.
Essa psicopatia sem dó deve nos fazer pensar, e
repensar, não só sobre os relacionamentos que mantemos, mas as nossas próprias
atitudes. Afinal, somos todos humanos. Por isso, já que (ainda) não nascemos
com dispositivo detector de psicopatia, fiquemos atentos às lábias sedutoras, egoísticas
e egóicas. Depois da disparada fuga emergencial, podemos até pensar em
participar da Corrida Internacional de São Silvestre.
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