Por não compreender, estou me sentindo quase o garoto, que, no meio dos omissos, gritou: “O rei está nu!”... Eu escrevo (não grito): Nossa humanidade está doente!... E não há diagnostico que possa precisar o grau de enfermidade. Não havendo diagnostico, não há medicamento, nem vacina. Os laboratorios podem continuar fazendo conluio com os medicos, para venderem cada vez mais remedios, que não há como combater a doença que afeta a humanidade, da qual faço parte, e, por isso, me preocupo mais ainda.
A nossa humanidade está doente!... Preferimos nos manter engaiolados – assim, nos sentimos menos inseguros. Engaiolados, sim. Hoje, nosso condominio tem grades, nosso jardim tem grades, nossa casa tem grades, nossa garagem tem grades, nossas janelas têm grades, nossa sacada tem grades. Levar as crianças, para brincar no parque, é perigoso. Fazer uma caminhada é perigoso. Passear, nos finais de semana, é perigoso. Tomar sorvete, comer pipoca, na velha praça, é perigoso. Diante do perigo, baixamos a cabeça, recuamos, desistimos, e até esquecemos o que, um dia, fizemos – ao ar livre, livres do medo de todos os perigos. Pelas frestas das grades, cada vez mais pesadas e imponentes, espiamos a vida lá fora...
Doente, a nossa humanidade se refugia na internet, no canto de um quarto esquecido de uma casa esquecida. Tem gente que não sai de perto do computador (sempre conectado), não sai do quarto, não sai de casa, não sai da chamada “vida virtual”. Na internet, podemos ser quem somos, quem não somos, quem gostaríamos de ser, quem recusamos ser. Na internet, somos crianças – mimadas, muito mimadas – brincando de gente grande, como queremos que seja a nossa vida, deletando o que não nos causa prazer. Na internet, extravasamos nossas frustrações (conosco mesmos), como quem encontra, depois de tanto procurar, em mais de duzentos quilometros de estrada, um banheiro. Nesse “alterador de realidade”, refugiamos nossos medos, nossas angustias, nossos sonhos, nossos pesadelos. E ainda podemos nos sentir amados (?) – tanto, que até fazemos “sexo virtual” (de graça, sem precisarmos gastar com preservativos, nem com todos os inconvenientes do “depois”, sem o risco de gravidez indesejada).
O Brasil, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), é um dos países onde mais as farmacias se proliferam. Na maioria das cidades brasileiras, há cerca de duas farmácias, em cada quadra. Nem vou calcular essa estimativa. O que me preocupa mesmo é ver, diariamente, por onde passo, gente sorrindo, ao entrar nas farmacias. E ainda tem gente (já testemunhei isso) que entra na farmacia, como quem vai ao mercado: pede analgesico, anti-termico, anti-septico, anti-histaminico, anti-iterico, anti-helmintico, todos os ‘antis’ de uma lista infindável, demonstrando conhecimento de causa. Isso, na minha insignificante opinião, comprova que as pessoas estão se tornando ‘especialistas’ em medicamentos, familiarizadas que parecem estar com os remedinhos, às vezes até, aumentando o indice de hipocondria. Essa realidade está em todo lugar, para corroborar o que escrevo, já que há até discussão entre clientes e atendentes, nos balcões das farmacias. A ‘briga’ vai mais longe ainda, quando o medicamento solicitado tem “tarja preta”, e só pode ser vendido, com receita medica - a clientela vai à loucura, e tem gente que até esbraveja, na farmacia.
A nossa humanidade está tão doente, que já não mais reclama sequer os proprios direitos, se acomoda no silencio confortável da espera, sem a minima esperança. Por outro lado, a nossa humanidade, também, já não cumpre os deveres que lhe cabem. Diariamente, vemos crianças abandonadas – desamparadas nas ruas, e nas casas reconhecidas como “de família”. E mais: há meninos e meninas trabalhando, nas mais diversas funções, mendigando, fazendo cursos (de ballet, judô, natação, ou qualquer outra coisa), sem tempo de serem crianças, ou simplesmente esquecidos, na frente de um computador, de um aparelho de televisão. Diante disso, o governo responsabiliza a família, pela educação, ou falta de educação. Por sua vez, a família responsabiliza a escola, que responsabiliza o governo.
Medrosa, sempre mais insegura e titubeante, a nossa humanidade não quer mais investir em relacionamentos. Nada de amizade, ou “amor a dois”. Relacionamento dá muito trabalho, exige, da nossa humanidade, olhar o outro – e ninguém mais quer enxergar o outro, nem a si mesmo, muito menos compreender e aceitar, seja quem for. Nossa humanidade não quer pensar, sentir profundamente. Por isso, quem não foge à internet, está sempre buscando ‘anestesicos’, nas constantes “baladas noturnas”.
Cada vez mais insatisfeita – consigo mesma e com a propria vida -, a nossa humanidade escolhe consumir, consumir e consumir. Nossa humanidade participa de uma concorrencia (escrachada) de consumismo. Para isso, trabalha mais, faz hora extra, e se recusa a refletir a respeito. Depois de trabalhar, a nossa humanidade consome. Depois de consumir, a nossa humanidade descarta o que estava consumindo. Depois de descartar o consumido, a nossa humanidade trabalha, mais ainda, para adquirir mais produtos de consumo. Isso tudo está consumindo a minha, a tua – a nossa humanidade doente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário