Hoje
é dia de chorar a morte – a morte dos nossos entes queridos, e a nossa própria
morte. No próximo velório que chamarem você, observe que as pessoas choram,
diante do caixão, se entreolham, e choram mais ainda – ninguém sabe quem será o
próximo. O que se sabe mesmo é que nem sempre o terminal vai na frente do
fulminante, enquanto o inesperado continua sendo o primeiro da fila.
Durante
todo o tempo em que estamos nessa condição que chamamos vida, sofremos diversas
mortes. Penso que a morte não anunciada vai além da morte por acidente, homicídio,
ou suicídio (anunciado sempre, por sinais). Talvez, essa morte que me refiro
seja a mais profunda, e menos dolorida, de todas as mortes. Está tão incrustada
no fundo mais fundo do ser humano, que nem chega doer, coberta que fica por
tudo o que ‘parece’ vida, em total abandono, na vala do desperdício esquecido.
Na
minha insignificante opinião, tantas vezes, morremos para os outros (nem todos),
mas permanecemos aconchegados (vivos) nos braços de quem nos quer bem, a troco
de nada mesmo. No contraponto, quantos permanecem (tão) vivos, por tantas vidas
inteiras que seguem, ignorando qualquer lógica do tempo, que (quase) tudo faz
esquecer. Mas morrer para os outros não é a pior morte (ainda).
A
pior morte, na minha visão estrábica, não é a anunciada. É aquela que causamos
em nós mesmos – um só alguém, ou ninguém, fica sabendo. A criatura vai morrendo
aos poucos – longe da lógica do tempo das rugas e senilidade. Tem gente que vai
abandonando sonhos e projetos, pelo caminho. No início, até percebe o que está
fazendo com a própria vida, escolhendo. Não demora muito, essa rendição - em
vida, à morte - é transformada em hábito, vício até. E não há morte mais vazia
e triste. Morte anestesiada pela ausência de sonhos (vida).
Penso
que especialmente hoje não deveria ser dia de refletirmos sobre a morte. A
morte já nos chega com tudo pensado – sem direito (mesmo!) de qualquer escolha.
Hoje – e sempre – é dia de refletirmos sobre a vida, a nossa vida, de ninguém
mais. Até por que temos a vida que temos, por que fazemos escolhas, mesmo
quando justificamos que não temos outra escolha (existe, sim). Mais justo seria
reconhecermos que não conseguimos enxergar mais escolhas, por que escolhemos –
sempre -, independente de.
De
repente, a morte (implacável!), quase nunca esperada, nos chega – que haja
muita vida, dentro de nós, quando o inevitável acontecer. Que a nossa vida seja
tanta, que transborde à vida que fica, e segue...
...E continuemos orando pelos nossos mortos, e
pelos sonhos e projetos que morrem, em completo desamparo íntimo, a cada instante...
(...)
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